Ao final da década de 1980, o Brasil sofria uma das maiores crises de sua história. Recém-saído da ditadura militar instalada em 1964, afundado em extrema inflação e escândalos de corrupção na política; não parecia haver esperança de uma guinada no país. Eis que surge Fernando Collor de Melo, o caçador de marajás.
Uma história conhecida
por todos... Ele chegou prometendo acabar com os problemas do país, incluindo
caçar os corruptos da política, mas nada fez. Aliás, até que fez. E o problema
reside aí. Collor se saiu pior do que todos aqueles que ameaçou caçar. O então
jovem político decepcionou em seu governo, após orquestrar uma campanha
impecável. Isso devido a seu carisma, instrução, disposição e tantos outros
fatores que foram somados a um preponderante: o apoio da imprensa. Nunca
política e mídia estiveram tão ligadas no Brasil do que na chamada Era Collor.
E ele usou e abusou dela para se promover.
O doutor em Ciências
Sociais pela UFRN e especialista em Marketing político e persuasão eleitoral
pela PUC/RS, Marcelo Bolshaw Gomes, acredita que o medo das camadas
conservadoras na eleição de um candidato de extrema esquerda ajudou: “Eles
tinham medo de eleger um candidato de extrema esquerda ou qualquer outro
governante do PMDB ou aliado de Sarney, então a camada conservadora se utilizou
da imprensa para apoiar a candidatura de Collor, que não tinha envolvimento
direto com os partidos’’. Ele ainda destaca o papel importante da, até então,
assessora de imprensa de Collor na época Belisa Ribeiro: “O papel dela foi
aproveitar os buracos que ocorriam em matérias e deixavam espaço no jornal, ela
então ocupava esses espaços. E não só nos jornais, como também em revistas,
para promover uma imagem de perseguidor de corruptos’’.
Dentre os meios de
comunicação utilizados na campanha, dois merecem grande destaque: a Revista
Veja e as Organizações Globo. A vendedora de cosméticos Maria Clara, 45 anos,
se recorda desse período: “Era comum ver em bancas de jornais e revistas
edições da Veja com Collor na capa acompanhadas de frases de efeito, que
acabaram se tornando lemas de sua campanha, como O Caçador de Marajás’’.
Enquanto isso, a Rede Globo liderada por Roberto Marinho deixava cada vez mais
evidente sua preferência por Collor, sendo o auge durante o polêmico debate entre
o alagoano e Lula. Na época, o Jornal Nacional seguinte ao debate exibiu uma
versão tendenciosa do confronto. A história já foi até admitida pelo chefão da
Globo no período em seu livro e é relatada com minúcias por produções
independentes, como Notícias do Planalto.
Assim, um desconhecido
Fernando Collor que iniciou sua campanha presidencial com menos de 10% das
intenções de voto, crescia e em 1989 foi ao segundo turno com cerca de 8 mil
votos a mais que Lula. Êxito principalmente devido a uma competente campanha de
marketing. Para Bolshaw, “a imprensa tratou essa candidatura como um produto e
esse foi o marco mais conhecido da utilização de técnicas do marketing na
política brasileira”.
Mas a lua de mel não
durou muito. Acusado pelo seu próprio irmão, Pedro Collor, que chocou o país ao
estampar a capa da revista Veja acusando Fernando de usar PC Farias, seu braço
direito, como testa de ferro, o império começou a ruir. Daí para as denúncias
virem até do motorista da Presidência não demorou muito. Acuado pela população
e sem sustentação política, Collor renunciou na esperança de não ter seus
direitos políticos cassados. Em vão. O Congresso confirmou o impeachment do
presidente, que simplesmente sumiu da mídia que ele tanto idolatrava por anos,
apesar de ainda chefiar a TV Gazeta, afiliada da Globo em Alagoas.
A assistente social
Cláudia Andreza, 34 anos, que era adolescente na época da mobilização popular
pela saída de Collor, relembra a unidade nacional estabelecida contra aquele
que antes despertava a confiança da nação. “Quando ele saiu, a comemoração com
as cores da bandeira foi parecida com Copa do Mundo”, compara.
Em 1997, Collor
ressurgiria em horário nobre. Ele topou uma entrevista com a repórter Sônia
Bridi sob a condição de o conteúdo ser veiculado sem cortes no Jornal Nacional.
Assim foi. E também foi mais um papelão para o ex-presidente. Questionado pela
jornalista sobre as denúncias contra ele, Collor tirou a “veemência da força
interior e do coração” para respostas, no mínimo, rebeldes. Após 10 minutos de
conversa, veiculados para 45 pontos de audiência, um novo e conveniente período
sabático de 5 anos surgiu. Prazo para ele recuperar seus direitos políticos e
disputar o governo alagoano. Em 2002, não deu certo contra Ronaldo Lessa, que
faturou a disputa em 1º turno. Mas a “vingança” veio em 2006, quando Collor
derrotou Lessa na disputa por uma cadeira no Senado. Em 2010, nova derrota para
o governo, dessa vez diante de Teotônio Vilela, mas o mandato estava garantido,
já que a duração dele no Senado é de 8 anos.
Agora filiado ao PTB,
ele ainda reflete sobre qual cargo disputará em 2014, mas aparece no páreo em
qualquer cenário do seu estado natal. Dentre suas atividades mais recentes na
tribuna do Senado, destaca-se o discurso na homenagem aos 25 anos da
promulgação da Constituição. Em 29/10, diante de Lula, seu inimigo em 1989, mas
agora aliado e que também estava na homenagem, declarou: “Posso afirmar, portanto, que o processo de impeachment a que fui submetido, com minha
participação direta e isenta, serviu para consolidar a Constituição, então com
apenas quatro anos de vigência”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é realmente muito importante para o Território. Comente! O espaço é todo seu :)