terça-feira, 30 de abril de 2013

125 anos depois da Lei Áurea, Brasil convive com escravidão moderna

Em 13 de maio de 1888, era assinada a Lei Áurea, que supostamente extinguia a escravidão no Brasil. Hoje, também existe o artigo 149 do Código Penal, que determina reclusão de dois até oito anos para quem reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”. O artigo ganhou reforço para sua validade em agosto de 2003, quando o Palácio do Planalto, na gestão do então presidente Lula, criou a Comissão Nacional Para a Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE), que perdura até a atualidade.

Mas isso não impede que milhares de trabalhadores pobres, brasileiros ou não, acabem sendo escravizados na atualidade. Seja no campo ou em oficinas de costura instaladas nos grandes centros, muitos deles sofrem torturas psicológicas e até espancamentos.  Segundo o Ministério do Trabalho, 44 mil trabalhadores já foram retirados dessas condições desde 1995.

Tais números chamam a atenção da imprensa internacional. A BBC recentemente produziu um conteúdo afirmando que esse novo modelo de escravidão é fruto da crescente demanda por mão de obra no país. A rede londrina cita que 129 estrangeiros foram resgatados em 2010 apenas no estado de São Paulo (em todo o Brasil, foram 2.517, sendo 559 no Pará, o estado com mais libertações no ano), porém a população de 300 mil bolivianos na região indica que os números podem ser maiores. Essas buscas renderam o pagamento de R$8,000,000 em indenizações somente em 2010.

Parte dessas indenizações vem de grandes corporações, como a Mauricéa, do ramo da avicultura. A empresa nordestina manteria ao menos 29 pessoas em condições análogas à do trabalho escravo. Ações movidas pelo ministério público já renderam o pagamento de R$979,000, sendo que mais R$1,900,000 podem ser utilizados como compensação aos “danos morais coletivos”, conforme estabeleceu o MP. O caso foi descoberto no último dia 12 de abril.

Coincidentemente, 29 também é o número de trabalhadores resgatados numa filial paulista da confecção Luigi Bertolli, em 22 de março. Na fábrica, as pessoas que trabalhavam entre 12h e 14h por dia não tinham direitos trabalhistas, como férias e 13º salário. O ambiente também tinha ligações clandestinas elétricas e alimentos guardados ao lado de animais. Tal espaço já havia sido mostrado durante uma edição do programa Profissão Repórter levada ao ar em agosto de 2012.

Em artigo publicado em janeiro, o jornal interno do Senado Federal cita outros tipos de escravidão na atualidade, como a de caminhoneiros, pressionados a trabalhar até 18h diárias em virtude de ganharem por carga entregue. O Congresso terminou em março uma CPI sobre o trabalho escravo, porém sem relatório final por causa de uma falta de acordo supostamente motivada pela bancada ruralista. O deputado Cláudio Puty (PT – Bahia), presidente da comissão, declarou na época em entrevista coletiva que “não há possibilidade de acordo que não seja um grave ataque aos trabalhadores rurais e aos direitos trabalhistas. Nós não vamos ser coniventes e, por isso, encerramos sem um relatório final”.

Os balanços oficiais mais recentes indicam que em 2012 o número de resgates subiu para 2.750, após ter sido de 2.491 em 2011. O atual coordenador do CONATRAE, José Guerra, vê a certa regularidade nos números com desconfiança, já que, segundo ele, a fiscalização está sendo intensificada em maior escala. “Pode também estar acontecendo uma mudança no perfil com uma ‘sofisticação’ dos casos de trabalho escravo”, disse ao telejornal Repórter Brasil. A Comissão Pastoral da Terra estima que 25 mil novos brasileiros sejam escravizados a cada ano.

Cerca de 10 a 15% dos trabalhadores libertos acaba retornando ao trabalho escravo pela falta de opção derivada da ausência de qualificação profissional. "O trabalhador volta para casa com três meses de seguro-desemprego no bolso, mais verbas rescisórias, mas assim que o dinheiro acaba ele volta a migrar e acaba escravizado de novo", definiu Leonardo Sakamoto, presidente de uma ONG voltada ao tema em entrevista reportagem publicada no portal da BBC.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

O contrato de leitura equivocado do Balanço Geral SP


Quando um produto se encontra subordinado ao departamento de jornalismo da emissora, se espera uma seriedade agregada ao formato, mesmo com a tendência de informalidade buscada. Mas alguns programas ultrapassam os limites e se tornam verdadeiros espetáculos de bizarrice. A edição paulista do Balanço Geral, televisionada pela TV Record, é um bom exemplo disso. Exemplificarei abaixo as razões que me levam a manter uma relação de oposição com o jornalístico.

Primeiramente, é preciso constar que apesar de intitulado de Balanço Geral SP, a atração trata de temas que vão além do estado e também é transmitida para rede nacional através das antenas parabólicas e operadoras de TV fechada, além de ocupar a grade nas localidades que não possuem produção local. E uma das maiores demonstrações de falta de bom senso do programa veio justamente quando ele abordava a tragédia de Santa Maria (RS), em que o incêndio na boate Kiss matou 241 pessoas.

No dia imediatamente depois da quinta maior tragédia do Brasil (28/1/13), Geraldo reproduziu o cenário de uma boate em seu palco. Móveis foram espalhados pelo cenário e até mesmo sapatos eram distribuídos de maneira aleatória pelo palco para verossimilhança ficar mais forte. O próprio solicitava para produção jogar mais fumaça durante a simulação. Aliás, fumaça obtida através de gelo seco. E a mistura entre a bagunça formada com a chegada de novas informações sobre os feridos não permitiu nem mesmo que a suposta prestação de serviço ao educar as pessoas como agir em situações similares fosse prestada.

Uma semana depois, o global Fantástico partiu da mesma premissa: Simular o que aconteceu na boate Kiss durante o incêndio. A diferença é que o programa global adotou um tom sóbrio durante sua reportagem e construiu uma cidade cenográfica fiel ao espaço físico da casa de shows antes da tragédia, se livrando de exageros insensíveis. 

Por envolver diretamente um acidente que teve repercussão até mesmo internacional, a cobertura sobre o incêndio em Santa Maria talvez tenha sido a feita pelo Balanço Geral SP que gerou mais críticas na imprensa especializada, mas passou longe de ser a primeira apontada como de mau gosto.

Em outra situação, ao comentar um assalto, o apresentador Geraldo Luís se surpreendeu com o tamanho da arma utilizada pelo bandido e disse que daria até o “loló” caso fosse vítima de uma situação similar.

Outras situações constrangedoras para o jornalístico foram quando Geraldo deixou as calças caírem e apresentou a atração vestido como um personagem do filme Avatar, que seria exibido pela emissora naquela semana.

Recentemente, até a tensão nuclear gerada pela Coreia do Norte virou motivo de piada. Ou seja, notícias relevantes se tornam deixas para piadas, não para informações. E isso se utilizando do departamento de jornalismo do canal, o que diferencia completamente a situação de programas humorísticos que abordam temas jornalísticos, como o CQC (Band) e o Furo MTV.

O Balanço Geral SP é transmitido de segunda a sexta pela Record, canal tradicionalmente associado com exageros em suas coberturas, em duas edições (6h15 e 12h). Atualmente, apenas a da hora do almoço tem a apresentação de Geraldo Luís, que constantemente consegue bons índices de audiência, deixando o canal até em primeiro lugar durante muitas ocasiões.

Enquanto os índices seguirem satisfatórios, dificilmente veremos uma mudança do estilo do Balanço Geral SP para que se torne jornalismo de verdade, o esperado em um canal que utiliza justamente de “Jornalismo Verdade” como slogan. 

domingo, 21 de abril de 2013

Fatores de coerência

A construção da coerência em um texto depende de diversos fatores, que são absolutamente essenciais para boa compreensão. Afinal, um texto sem coerência não passa de um emaranhado de palavras.

Existe a ressalva de que nem todos os textos são escritos para serem compreendidos pela maioria. Um artigo científico já é produzido pelo seu autor tendo em mente o público limitado para o qual é destinado. Mas mesmo assim tem que ser coerente de acordo com seu foco, conste-se.

E o que nós percebemos como coerente depende do conhecimento de mundo que temos acumulado. O desconhecido obviamente nos irá soar sem coerência, como seria o caso do artigo científico para boa parcela da população brasileira. Para justificar essa forma com que armazenamos o conhecimento, existem alguns modelos cognitivos, como os frames, esquemas e scripts.

Essa ponderação de que o mesmo texto pode ser compreendido de maneiras diferentes por duas pessoas existe pelo fato de que o conhecimento é acumulado através de memórias pessoais, impossibilitando que dois indivíduos (no caso, autor e leitor) compartilhem o mesmo conhecimento.

E diversos leitores também não irão compartilhar o mesmo conhecimento, é claro. O mesmo texto vai ser interpretado de inúmeras formas, dependendo da focalização buscada.

O contexto também é essencial para o melhor entendimento de um texto. As mesmas expressões podem ganhar sentidos diferentes, perdendo ou ganhando coerência, a depender da situação em que estão inseridas, sendo que esse também deve ser captado pelo receptor, assim como as inferências.

Também existem fatores contextualizadores mais claros, como a citação de uma data ou local. Quando alguém cita o dia 11 de setembro o relacionando ao luto, dificilmente vai precisar explicar ao interlocutor a razão disso, por exemplo.

RESUMO: Todo texto, por mais limitado que seja seu foco, deve ser coerente. Para que tal coerência ocorra, os produtores do conteúdo se utilizam de diversos elementos linguísticos e até mesmo cognitivos. Essa multiplicidade de fatores, alguns oriundos do próprio leitor, é que propicia o entendimento de um texto como coerente.

domingo, 14 de abril de 2013

O mito da caverna e a sociedade atual: O conflito entre aparência e realidade

com Luana Angélica de Melo Bittencourt 

INTRODUÇÃO
Considerado uma das mais poderosas metáforas já produzidas, o mito da caverna, narrado por Platão no livro VII de A República, se tornou um dos trechos mais celebrados no mundo filosófico pela forma com que evidencia a prisão dos homens a conceitos que lhes são impostos.

1. O mito da caverna
Na alegoria, Sócrates dialoga com Glauco sobre um suposto grupo de homens que estariam acorrentados no interior de uma caverna desde o nascimento, observando durante todo o tempo apenas uma parede iluminada por uma fogueira. O mundo deles se baseava em contemplar aquelas sombras, inclusive as analisando e julgando. Porém, se um dos prisioneiros da caverna pudesse conhecer o mundo exterior, assim notando que desconhecia a realidade e vivia em um mundo de ilusões e sombras, ele inicialmente teria dificuldades em enxergar diretamente a parte externa da caverna e tudo que a habita por causa da claridade. Após se habituar à luz, caso voltasse ao interior da caverna para celebrar as boas novas com os prisioneiros, ele provavelmente seria desacreditado e tratado como louco, chegando até a ser ameaçado de morte pelos demais.

2. Representações do mito da caverna na sociedade atual
Esse mito foi escrito por Platão há milênios, porém pode perfeitamente ser aplicado ao nosso atual contexto de sociedade e até mesmo vislumbrado para um eventual futuro, como foi feito no filme Matrix, em que os seres também acreditam fielmente em uma realidade virtual, tal quais os prisioneiros da caverna.

Mesmo sem estar aprisionada de fato, a sociedade atual também é influenciada pelo que lhe é imposto, principalmente pelos grandes grupos de mídia. Por exemplo, as novelas são capazes de gerar “modismos eternos enquanto duram”, como cita uma chamada exibida pela TV Globo, maior produtora do gênero no Brasil.

Ou seja, somos doutrinados pelo conhecimento do mundo sensível, aquele que captamos graças aos nossos sentidos (visão e audição para captação das ideias transmitidas pela televisão, por exemplo).

Essa influência dos meios de comunicação faz com que vejamos a realidade de uma forma distorcida. Exemplificando isso, podemos levar em conta que apesar de não conhecermos a fundo os conflitos no Oriente Médio, opinamos sobre eles levando em conta apenas informações que já nos foram transmitidas por terceiros. Ou seja, nossa visão do mundo real é fruto da visão de outra(s) pessoa(s).

3. A complicada busca pela episteme
Pelas dificuldades passadas para que o prisioneiro pudesse obter a liberdade, Platão também evidencia que a chegada ao conhecimento epistêmico requer sacrifícios, assim como também ocorre na atualidade, já que nosso conhecimento é avaliado pelos mais diferentes métodos desde a infância.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Resenha: Publicar ou perecer? Eis a questão

MOTTA-ROTH, Désirée. Publique ou pereça. In: Produção textual na universidade. São Paulo: Parábola Editorial, 2010. Cap. 1, p. 13-25

Désirée Motta-Roth e Graciela Rabuske Hendges possuem amplos currículos na área lingüística, incluindo passagens tendo, respectivamente, os títulos de pós-doutorado e doutorado. O foco de suas pesquisas no ensino é comprovado em seus currículos e evidenciado na obra abaixo resenhada, publicada originalmente em 2010.

Os 8 capítulos principais da publicação são distribuídos em 167 páginas, sendo que o primeiro analisa a problemática do “publique ou pereça”, fazendo uma contextualização da realidade brasileira com a estadunidense e questionando que a quantidade de publicações pode acabar se tornando mais relevante do que a qualidade das mesmas, um sistema falho na visão das autoras, que enumeram formas de o superar.

Se utilizando de uma linguagem direta, a obra é repleta de exemplos que descomplicam ainda mais o seu sentido. As estratégias de preparação do conteúdo e audiência crescente do material acadêmico produzido são assuntos abordados com atenção nesse capítulo inicial.


A acessibilidade dos termos usados e o didatismo abrem o precedente para que este conteúdo seja devorado por qualquer pessoa com maior interesse no mundo da pesquisa universitária, porém tal foco também o torna inevitavelmente mais útil para quem está ligado ao meio. De qualquer modo, a abertura dessa obra, escrita praticamente como um manual, certamente será compreendida por quem se aventurar a desbravar ela, gerando uma boa dose de conhecimento ao leitor.

terça-feira, 9 de abril de 2013

A despedida que não aconteceu

As trocas nos comandos dos jornalísticos globais recentemente se tornaram eventos que dominam as edições em que elas são consumadas. Nada mais justo. Afinal, o público merece ver a despedida de alguém que o fez companhia por diversos anos. Foi assim com Fátima Bernardes e Patrícia Poeta no Jornal Nacional, a própria Poeta e Renata Ceribelli no Fantástico, Mariana Godoy, Chico Pinheiro e César Tralli no SPTV 1, dentre tantas outras. Ou seja, esses momentos pareciam ter se tornados rotineiros. Mas a suposta rotina foi quebrada na última sexta, derradeiro dia em que Carla Vilhena esteve sob o comando do Bom Dia SP.

Segundo o colunista Daniel Castro, Carla escreveu um texto para se despedir do público, porém foi impedida pela direção de o ler no ar. Abalada, ela não aguentou seguir no ar e teve de ser substituída pela moça do tempo Eliana Marques no comando do bloco paulista do Bom Dia Brasil.

E a troca no comando do Bom Dia SP ganha contornos ainda mais estranhos quando constatado que a Carla foi imediatamente substituída na última segunda por Monalisa Perrone, sendo que Rodrigo Bocardi vai assumir definitivamente o comando do jornalístico em breve.

Ainda segundo o colunista, Carla descobriu sobre a mudança apenas na véspera e através da imprensa. Em vídeo da parte que a jornalista chegou a apresentar no Bom Dia Brasil da sexta, o abalo dela é visível. 

Egressa da primeira edição do SPTV antes de assumir o Bom Dia SP, Carla deve se tornar repórter do Fantástico.

Atualização




Atualização da atualização

Se utilizando da assessoria de imprensa, Carla Vilhena finalmente falou oficialmente sobre o tema. Abaixo, segue a nota que foi reproduzida pelo iG:

"Em relação à nota sobre minha saída do Bom Dia São Paulo, gostaria de esclarecer que fui informada por Cristina Piasentini, diretora de jornalismo em SP, uma semana antes de sair de férias, que, por conta de um convite do Fantástico para reforçar a equipe do programa na capital paulista, caso eu aceitasse, deixaria a bancada do matinal. Depois de anos acordando cedo, embora ame o Bom Dia, aceitei. Não é verdade que chorei no ar, tendo de ser substituída às pressas. Sou uma profissional com anos de atividade, experiente. Como qualquer pessoa, já me emocionei com notícias do próprio telejornal, nunca por uma situação pessoal. Naquele dia, isso não ocorreu. Já havia encerrado minha participação prevista no Bom Dia Brasil, quando me comovi conversando com uma colega grávida. A participação de Eliana Marques no Bom Dia Brasil, chamando o Globocop, já tinha ocorrido em outras ocasiões. Quis me despedir no ar na sexta, mas fui informada para não fazê-lo, porque estava saindo de férias. Farei minha despedida ao apresentar Rodrigo Bocardi ao público na estreia dele, como já ocorrido em outras ocasiões com outros colegas. Lamento que uma mudança tão positiva na minha vida profissional tenha gerado tantas notícias truncadas. Sempre fui muito bem tratada na Globo, por todos, e continuo a ser. Tenho orgulho de fazer parte dessa equipe e ajudar a engrandecer o jornalismo da maior empresa de comunicação do país. A Globo me autorizou a dizer que o anúncio oficial sobre a minha saída e a entrada do Bocardi será feito nos próximos dias, quando a emissora achar conveniente. Carla Vilhena".