Em 13 de maio de 1888, era assinada a
Lei Áurea, que supostamente extinguia a escravidão no Brasil. Hoje, também
existe o artigo 149 do Código Penal, que determina reclusão de dois até oito
anos para quem “reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer
submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a
condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua
locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto”. O artigo
ganhou reforço para sua validade em agosto de 2003, quando o Palácio do
Planalto, na gestão do então presidente Lula, criou a Comissão Nacional Para a
Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE), que perdura até a atualidade.
Mas isso não impede que milhares de trabalhadores pobres,
brasileiros ou não, acabem sendo escravizados na atualidade. Seja no campo ou
em oficinas de costura instaladas nos grandes centros, muitos deles sofrem
torturas psicológicas e até espancamentos.
Segundo o Ministério do Trabalho, 44 mil trabalhadores já foram
retirados dessas condições desde 1995.
Tais números chamam a atenção da imprensa
internacional. A BBC recentemente produziu um conteúdo afirmando que esse novo
modelo de escravidão é fruto da crescente demanda por mão de obra no país. A
rede londrina cita que 129 estrangeiros foram resgatados em 2010 apenas no
estado de São Paulo (em todo o Brasil, foram 2.517, sendo 559 no Pará, o estado
com mais libertações no ano), porém a população de 300 mil bolivianos na região
indica que os números podem ser maiores. Essas buscas renderam o pagamento de
R$8,000,000 em indenizações somente em 2010.
Parte dessas indenizações vem de grandes
corporações, como a Mauricéa, do ramo da avicultura. A empresa nordestina
manteria ao menos 29 pessoas em condições análogas à do trabalho escravo. Ações
movidas pelo ministério público já renderam o pagamento de R$979,000, sendo que
mais R$1,900,000 podem ser utilizados como compensação aos “danos morais
coletivos”, conforme estabeleceu o MP. O caso foi descoberto no último dia 12
de abril.
Coincidentemente, 29 também é o número de
trabalhadores resgatados numa filial paulista da confecção Luigi Bertolli, em
22 de março. Na fábrica, as pessoas que trabalhavam entre 12h e 14h por dia não
tinham direitos trabalhistas, como férias e 13º salário. O ambiente também
tinha ligações clandestinas elétricas e alimentos guardados ao lado de animais.
Tal espaço já havia sido mostrado durante uma edição do programa Profissão
Repórter levada ao ar em agosto de 2012.
Em artigo publicado em janeiro, o jornal interno do
Senado Federal cita outros tipos de escravidão na atualidade, como a de
caminhoneiros, pressionados a trabalhar até 18h diárias em virtude de ganharem
por carga entregue. O Congresso terminou em março uma CPI sobre o trabalho
escravo, porém sem relatório final por causa de uma falta de acordo
supostamente motivada pela bancada ruralista. O deputado Cláudio Puty (PT –
Bahia), presidente da comissão, declarou na época em entrevista coletiva que
“não há possibilidade de acordo que não seja um grave ataque aos
trabalhadores rurais e aos direitos trabalhistas. Nós não vamos ser coniventes
e, por isso, encerramos sem um relatório final”.
Os balanços oficiais mais recentes indicam que em
2012 o número de resgates subiu para 2.750, após ter sido de 2.491 em 2011. O
atual coordenador do CONATRAE, José Guerra, vê a certa regularidade nos números
com desconfiança, já que, segundo ele, a fiscalização está sendo intensificada
em maior escala. “Pode também estar acontecendo uma mudança no perfil com uma
‘sofisticação’ dos casos de trabalho escravo”, disse ao telejornal Repórter Brasil. A Comissão Pastoral da Terra estima que 25
mil novos brasileiros sejam escravizados a cada ano.
Cerca de 10 a 15% dos trabalhadores
libertos acaba retornando ao trabalho escravo pela falta de opção derivada da
ausência de qualificação profissional. "O trabalhador volta para casa com
três meses de seguro-desemprego no bolso, mais verbas rescisórias, mas assim
que o dinheiro acaba ele volta a migrar e acaba escravizado de novo",
definiu Leonardo Sakamoto, presidente de uma ONG voltada ao tema em entrevista
reportagem publicada no portal da BBC.
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